Este Blog é um espaço dedicado à divulgação de textos que refletem sobre a política econômica do país, com seus impactos sobre o direito. Existem duas correntes dentro do Direito Político e Econômico; "A Cidadania Modelando o Estado" e "Os limites jurídicos do Poder Econômico".

segunda-feira, junho 18, 2007

Responsabilidade Civil Por Ato Lícito

RESPONSABILIDADE CIVIL POR ATO LÍCITO

Pierre Santos Castro[1]

RESUMO
A responsabilidade civil advém de um conjunto de princípios que incidem da obrigação de reparar. Sua principal função é a reparação do dano, restituindo a vítima ao estado em que se encontrava caso o dano não ocorresse. A reparação civil encontra-se disseminada na legislação e, em síntese, no artigo 186 do Código Civil. A reparação civil ocorre não apenas quando se infringe uma norma, ela também é possível em certos casos como nos atos lícitos, ou seja, atos positivados.
A reparação do dano praticado por ato lícito existe em duas vertentes: de um lado o Direito Público que respeita a estrutura do Estado e de outro o Direito Privado que se dirige ao cidadão. Na responsabilidade civil por ato lícito, em tese, não são pressupostos o dolo nem a culpa, o ato deve ser lícito para ser possível a indenização.
Palavras-chave: Estado.Responsabilidade Civil. Ato lícito.



ABSTRACT
The civil responsibility comes from a set of priciples which are related to the repairing obligation. Its main function is to repair a damage, restituting the victim to the condition in which he/she was if the damage did not occur. The civl repairing is spread in the legislation and in synthesis in the 186 article of the Civil Code. The civil repairing occurs not only when a rule is infringed, it is also possible in some cases such as in the lawful acts, that means, positive acts.
The repairing of a damage practiced by lawful act exists in two fields: from one side there is the Public law that respects the State structure and in the other side there is the Private Law which is guided to the citzen. In the civil responsibility for civil act, in thesis, neither dolo nor guiltness are previouly considered, the act mus be lawful for the damage be possible.
Key words: State. Responsiblility Civil. Lawful
















INTRODUÇÃO


RESPONSABILIDADE CIVÍL POR ATO LÍCITO

A responsabilidade civil advém de um conjunto de princípios, que incidem da obrigação de reparar.
O princípio elementar é o da “MORALIDADE DOS ATOS HUMANOS” Bonum faciendum, malum vitandum (o bem deve ser praticado, o mal evitado).
A maior e principal função da reparação do dano é a de restituir a vítima de dano ao estado em que se estaria se o dano não ocorresse.


DESENVOLVIMENTO

Conforme os ensinamentos do Professor Dr. Milton Paulo de Carvalho[2], podemos dividir a Responsabilidade Civil da seguinte forma: Contratual, extracontratual ou aquiliana e por força de lei


TEORIA GERAL

1 – Fontes da Responsabilidade Civil
São fontes da Responsabilidade Civil, a culpa o risco e a tutela legal (Ato lícito)
2 – Elementos da Responsabilidade Civil
São elementos da responsabilidade civil, a ação ou omissão o nexo causal e o dano
3 – Efeito (reparação) da Responsabilidade Civil
In natura, ou seja, voltar a coisa ao estado que se encontrava antes, ou in Pecúnia, ou seja, em moeda.
(O sistema acima se aplica a todos os atos ilícitos, principalmente ao dano moral).
A parte a que esse trabalho pretende se ater é a princípio a reparação causada por ato lícito, tornar o ato indene, ou seja, tornar o ato indenizado.
Tal obrigação só emerge nos casos previstos em lei. O fundamento dessa obrigação é um ato irreprovável, é a tutela que a lei dispensa a certas pessoas em determinadas hipóteses, reprováveis ou não os atos causadores dos danos.
A responsabilidade não se ocupa apenas na reparação por violação de normas ou deveres com a reposição ao estado anterior, mas compreende também em certos casos, por ato lícito, provindo ou não do exercício da atividade eivada de risco.
A lei concede a certas pessoas a faculdade de praticarem determinados atos, necessários à conservação ou exploração de seus bens.
Porém como podem eles causar prejuízos a terceiros, ao mesmo tempo em que permitem sua realização são, portanto, lícitos, impõe a lei ao agente a obrigação de reparar os danos que eventualmente cause a terceiro.
DIFERENÇA ENTRE RESPONSABILIDADE MORAL E RESPONSABILIDADE JURÍDICA
1) A responsabilidade se aplica à pessoa; a imputabilidade, se aplica ao ato praticado.
2) Para a responsabilidade moral, basta somente a intenção da vontade da prática danosa.
3) Para a responsabilidade jurídica, é necessário o início do ato danoso, ou ato omissivo.
4) A reparação do dano pode ser lícito ou ilícito na sua origem, portanto todo comando jurídico deve ser moral.

RESPONSABILIDADE CIVIL CONCERNENTE AO ESTADO/CIDADÃO
A reparação por ato lícito tem duas vertentes: de um lado o Direito Público que respeita à estrutura do Estado, de outro o Direito Privado que se dirige ao cidadão.
A doutrina é extremamente rica no que se refere à Responsabilidade Civil tendo como figura o Direito Público, porém nem tanto quando se refere ao Direito Privado, provavelmente pelas possibilidades de se aplicar à reparação por ato lícito principalmente contra o Estado.
Vejamos o pensamento do Professor Gustavo Ordoqui Castilha, professor da Faculdade de
Direito da Universidade Nacional do Uruguai, com supedâneo na legislação de seu país;
“A obrigação de compensar, que surge como resposta do ordenamento jurídico ao exercício de uma atividade lícita que causa um dano, se caracteriza por desempenhar uma função consistente em ganhar um equilíbrio que modere ou neutralize o possível incremento de um patrimônio em prejuízo de outro. Ao tutelar-se tanto o exercício do direito como a situação do prejudicado, se busca que, em definitiva, nenhum dos ambos patrimônios resulte diminuição”.[3]

ALGUMAS FORMAS DE RESPONSABILIDADE CIVIL PÚBLICA
Responsabilidade por fato das leis; Responsabilidade por fato dos tratados e acordos internacionais; Responsabilidade por danos emergentes de medidas de aplicação das leis; Responsabilidade por fato dos regulamentos; Responsabilidade por danos resultantes de medidas de direção econômica; Responsabilidade por fato da função jurisdicional.
Dentre as responsabilidades apontadas, a desapropriação é a mais comum a ser usada pela doutrina. A desapropriação é ato lícito desde que motivada pelo Estado, e a motivação sendo lícita, deve prevalecer à vontade da coletividade perante o indivíduo, tornando o ato indenizável. Imaginemos, como exemplo, um proprietário de um terreno em uma determinada região que carece de um hospital. Esse terreno pode ser desapropriado pelo interesse da coletividade, caso realmente haja esse interesse.
A Responsabilidade Civil do Estado por Ato Lícito tem íntima ligação com o Direito Constitucional e Administrativo.
No caso da Desapropriação por Utilidade Pública ou Interesse Social, há também, para a entidade desapropriante, a obrigação de pagar a justa indenização, medida pelo prejuízo que o desapropriado sofre com a perda do direito. O fato gerador do prejuízo (ato jurídico de desapropriação) contém já, como seu elemento integrante, a obrigação de prestar o equivalente e nisso se distingue do denominado confisco de bens. Sendo em certo sentido equiparável a uma venda forçada ou a uma arrematação judicial. Outro exemplo que poderia ser usado seria o das modificações feitas nas vias públicas onde as mesmas podem depreciar os prédios já existentes no local.
Desta forma sendo a obra lícita, o montante pecuniário proporcional à desvalorização do prédio se torna lícito, portanto passível de ressarcimento.
Temos como exemplo o elevado da Avenida São João em São Paulo, que desvalorizou os prédios que o circundam.
A doutrina utiliza bastante o §6° do art. 37 CF para justificar o ressarcimento pelo ato lícito, senão vejamos:
“As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos, responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurando o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”.
Porém devemos fazer algumas observações em relação a dolo, culpa, ato lícito, ato ilícito e direito de regresso.
Na responsabilidade civil por ato lícito, em tese, não é pressuposto o dolo nem a culpa, o ato deve ser lícito para ser indene.
O artigo citado acima fala em direito de regresso, onde o mesmo se refere ao servidor/agente que culposamente ou dolosamente praticou o ato sancionável.
Portanto, em tese, se a ação dessas pessoas for lícita, não há o que se falar em direito de regresso, pois estariam elas cumprindo estritamente o seu dever legal.
Nesse caso separa-se o ato lícito, do ato ilícito no direito administrativo, pelo direito de regresso.
Sendo o ato ilícito, cabe direito de regresso contra o servidor ou agente, sendo o ato lícito não cabe direito de regresso.
O ato administrativo é a manifestação unilateral do Estado ou alguma entidade que o represente no exercício de suas prerrogativas, buscando, baseado na lei, o atendimento de um fim público: adquirir, modificar, declarar resguardar, transferir, extinguir ou impor obrigações aos administradores.
Encontramos então nos limites dos atos discricionários administrativos, a conectividade entre a responsabilidade civil do Estado e o direito administrativo.
Assim sendo, cabe-nos agora analisar a perfeição, validade e eficácia do ato administrativo, algumas semelhanças e diferenças.
Conforme o Doutrinador Diógenes Gasparini;
“Diz-se perfeito o ato administrativo quando completo ou formado. Vale dizer, quando naturalmente nada lhe falta; quando tem motivo, conteúdo, finalidade, forma, causa e assinatura da autoridade competente. Em suma: Quando o ato existe”.[4]
Celso Antônio Bandeira de Mello, ensina que:
“O ato administrativo é válido quando foi expedido em absoluta conformidade com as exigências do sistema normativo. Vale dizer, quando se encontra adequado aos requisitos estabelecidos pela ordem jurídica. Validade, pois, é a adequação do ato às exigências normativas”[5].
Para o saudoso Professor Hely Lopes Meirelles;
“A eficácia é a idoneidade que se reconhece ao ato administrativo para produzir os seus efeitos específicos. Pressupõe, portanto, a realização de todas as fases e operações necessária, à formação do ato final, segundo o Direito Positivo Vigente”.[6]
Analisando então a perfeição, validade e eficácia do ato administrativo, podemos encontrar comumente atos com desvio de finalidade, em que o seu desvio pode gerar o dever de indenizar.
O desvio de finalidade do ato, mesmo sendo lícito pelo agente administrativo, ao contrário do que foi dito antes, fugindo um pouco da regra, pode gerar o dever de indenizar. Porém aqui a indenização seria uma indenização civil.
Segundo Celso Antônio Bandeira de Mello, o desvio de finalidade também pode ocorrer:
“Quando o agente busca uma finalidade – ainda que de interesse público – alheia à “categoria” do ato que utilizou. Deveras, consoante advertiu o preclaro Seabra Fagundes: “Nada importa que a diferente finalidade com que tenha agido seja moralmente lícita. Mesmo moralizada e justa, o ato será inválido por divergir da orientação legal”.[7]
O ilícito administrativo não tem necessariamente conexão com o ilícito civil. O ilícito administrativo gera uma obrigação, como por exemplo, a exoneração do servidor.
Pode haver um ilícito administrativo e correspondentemente um ilícito civil que é o que gera o dever de indenizar.
Os atos administrativos presumem-se verdadeiros e aptos a produzirem seus efeitos, a partir da data de sua expedição, e assim sendo passa a administração a se responsabilizar pela licitude e/ou ilicitude de seus atos.
Conforme o Professor Fernando Facury Scaff;
“Na doutrina é comum encontrar autores que fazem distinção entre ressarcimento e indenização. Dizem que o termo ressarcimento deve ser empregado quando a atividade administrativa que ensejar a diminuição do patrimônio particular for lícita; e indenização, quando esta atividade for ilícita. Adotam este entendimento, entre outros, Renato Alessi e Yussef Said Cahali.[...] A conseqüência prática desta diferenciação se encontra no montante devido a ser pago ao prejudicado pelo ato danoso. No ressarcimento apenas se cobre a perda econômica ocorrida, havendo compensação de direitos. Já na indenização há um plus, que corresponde a um montante superior a uma compensação de direitos, sendo um verdadeiro pagamento pelo dano causado, alcançando outros itens, tal como o de “lucros cessantes”. [8]
A base de tal teoria firma-se pelo interesse público que conforme a lei e a doutrina dominante deve sobrepor-se ao interesse privado. Sendo assim, o dano lícito pode gerar ressarcimento e o dano ilícito gera indenização.
É estabelecido como princípio cogente nos casos e atos administrativos, direto ou funcional do Estado, dos permissionários e concessionários. Conseqüentemente não há de se negar direitos por falha ou ausência de previsão legal.
Negar hoje a responsabilidade do Estado em face do ato jurídico danoso é fugir da realidade e olvidar evidentes avanços na dogmática jurídica, que a sociedade moderna impõe, posto que o direito é dinâmico, cumprindo-lhe acompanhar a evolução constante das relações sociais e aos seus reclames, se a lei não os acompanha e se anacroniza, cabe ao intérprete adequá-los às novas situações acompanhar o desenvolvimento social, científico cultural, o progresso do homem, de forma que não ocorra nenhum estrago no Estado, ou na sociedade.
Conforme o pensamento de Carlos Pinto Coelho Motta[9], no Brasil, as teorias se dividem em fases:
1) Teoria da irresponsabilidade do Estado (características)
1)Até o século XIX 2) Estados monárquicos e absolutistas 3)Responsabilidade individual do agente público 4)Teoria da intangibilidade do soberano (The king can do no wrong,e, lê roi ne peut mal faire)
Foi adotada pela constituição política do Império do Brasil de 1824 (arts. 99 e 179, inciso XXIX); e constituição de 1891 (art. 82); lei n. 221/1894 (art. 13)
2) Teoria da culpa civil do Estado (características)
1)Estado liberal 2)Atos de império (irresponsabilidade) e atos de gestão (responsabilidade).
Código Civil de 1916, art. 15; decreto n. 24216/34; constituição republicana de 1934 (art.171) e de 1937 (art. 158).
3) Teoria da culpa administrativa do Estado
1) Adoção do direito público como norte da responsabilidade do Estado 2) Caso Agnes Blanco 3) Teoria da culpa anônima ou falta do serviço (Paul Duez e Guy Debeyre) 4) Hipóteses de indenização;retardamento, mau funcionamento ou inexistência do serviço.
Constituição Federal de 1946 (art. 194); Constituição Federal de 1967 (art. 105 e parágrafo único); Emenda n. 1 de 1969 (art. 107 e parágrafo único).
4) Teoria da responsabilidade objetiva do Estado
1) Fase atual 2) A responsabilidade independe de culpa 3) Basta à lesão, sem configuração de excludentes pelo Estado, salvo rara exceção, para caracterizar o dever de indenizar 4) Teoria baseada na solidariedade social.
Constituição Federal de 1988, art. 37, § 6º; Código Civil de 2002, art. 43.”[10]
Assim sendo então, o ato ilícito, tem por sua vez, como atributos caracterizados, a antijuricidade e a culpabilidade, ou seja, traduz a ação ou omissão contra legem intencional (dolo ou culpa).
Desse modo, apenas quando a lei expressamente preveja a possibilidade da responsabilidade objetiva, com fundamento na teoria do risco ou mesmo sem esse fundamento, é que se poderá admitir a indenização do dano decorrente de ato ilícito.
Em outras palavras, isso significa que a lei deverá assumir apenas aquilo que está previsto, e não o que na realidade a sociedade necessita, como progresso, desenvolvimento, pesquisas, evolução da pessoa no geral. No entanto administrativamente deveria cumprir o seu papel que é proporcionar à sociedade à proteção por meios do direito preventivo, administrando corretamente para que não haja dano algum à sociedade.
Cabe lembrar o art. 37 § 6º da CF. que legaliza a indenizabilidade do ato administrativo discricionário praticado com abuso de direito inclusive regressivamente. Senão vejamos
“As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo e culpa”. [11]
Quanto ao ato discricionário, vale ressaltar a posição do professor Diogens Gasparini
“Discricionários são os atos administrativos praticados pela Administração Pública conforme um dos comportamentos que a lei prescreve. Assim, cabe à Administração Pública escolher dito comportamento. Essa escolha se faz por critério de conveniência e oportunidade. A hipótese legal incumbe-se de indicar quando é possível essa atuação por meio das expressões: será facultado, poderá o poder público, ou outro da mesma natureza. Ante essa competência, a Administração Pública poderá deferir ou não certo pedido feito, que se lhe permite avaliar a solicitação formulada segundo os referidos critérios e o interesse público do momento”.[12]
Em relação à discricionariedade, cinco interessantes questões podem ser levantadas:
1- O ato discricionário está sujeito a lei?
2- Quais os limites da discricionariedade?
3- Quais os limites da vinculação?
4- O que é o desvio de finalidade?
5- Ato arbitrário é passível de nulidade?
Conforme Carmem Lúcia Antunes Rocha;“Discricionariedade foi, durante muito tempo, o outro nome da arbitrariedade legal. Sacrário intocável onde se resguardava imune, a atuação administrativa incontrolada ou mal controlada”.[13]
O princípio da legalidade norteia o ordenamento jurídico e, como exemplo, a atividade administrativa do Estado.
A competência vinculada e discricionária da administração pública deve levar em conta os critérios de conveniência e oportunidade, porém daqui para a arbitrariedade basta um passo.
O ato discricionário está vinculado à lei, ou seja, a apreciação subjetiva do caso concreto pela administração pública, assim sendo, tem a discricionariedade, como limite, o vinculo com a legalidade.
Conforme ensinamentos do Professor Carlos Pinto Coelho Motta “Evidencia-se que não há, pois, discricionariedade à margem da lei, mas sim em virtude da lei e na medida nela contida”.[14]
Afirma ainda o referido doutrinador que
“A doutrina moderna considera que não há ato essencialmente discricionário, mas ato praticado no exercício de competência discricionária, pelo que resta claro que alguns de seus requisitos serão necessariamente vinculados. Tal cautela se dá, principalmente, para se evitar a prática de atos indesejados, cujo conteúdo e finalidade venham a atender interesse particular daquele que se achar no direito de exercer uma atribuição, ao alvedrio de toda uma coletividade. Diante disso, são manifestamente vinculados: a finalidade (atendimento de um interesse público protegido pela lei), a competência (delimitada pela lei) e a forma (indicada na lei para a satisfação da finalidade pretendida). Ademais destes requisitos, haverá outros que serão fixados em razão da convivência e oportunidade da administração competente. Assim, tem-se que o exercício de qualquer competência discricionária é representado pela conjugação de requisitos legalmente determinados e de outros caracterizados pela apreciação subjetiva do administrador público”.[15]

A discricionariedade pode levar ao desvio de finalidade. A Administração Pública não pode se desnortear e utilizar sua competência para atingir um fim de conveniência privada.
Afirma Motta, que o desvio de finalidade ou
“O desvio de poder é, então, o exercício de uma competência administrativa para fins diversos daqueles fixados pelo ordenamento jurídico. Em regra, tem-se que qualquer ato administrativo estará vinculado ao atendimento de um fim público, mesmo que a ele não se reporte, explicitamente, a norma legal vigente. Não se busca, pois, o endereçamento de um ato a uma finalidade de interesse coletivo, mas sim o atendimento daquela finalidade pública, expressa ou implícita, relacionada com o ato editado”.[16]
Basta então para ocorrer o desvio de finalidade, que o fim alcançado seja diverso daquele fixado pela norma jurídica legal, que tiver atribuído a competência para a prática do ato. Pode ocorrer que mesmo o ato sendo lícito, porém desviado, torne possível a indenização. Podemos observar isso, analisando as palavras do ilustre Professor Min. Celso Antônio Bandeira de Mello:
“Quando o agente busca uma finalidade – ainda que de interesse público – alheia a “categoria” do ato que utilizou. Deveras, consoante advertiu o preclaro Seabra Fagundes: “Nada importa que a diferente finalidade com que tenha agido seja moralmente lícita. Mesmo moralizada e justa, o ato será inválido por divergir da orientação legal”[17]
Podemos então afirmar conforme o estudado, que o ato administrativo praticado com desvio de finalidade é nulo de pleno direito por não estar em conformidade com a finalidade, a forma e o motivo a que se destina e muito menos com o ordenamento jurídico.
Para o Professor Carlos Pinto Coelho Motta;
“Decretada a nulidade do ato, tem-se que essa retroagirá à data em que o ato maculado foi expedido, não sendo esse passível de convalidação, o que faz com que a ação para se questionar a nulidade absoluta de determinado ato administrativo seja imprescritível, ou seja, passível de invocação e questionamento a qualquer momento”.[18]
A nosso ver, a ação cabível para a validação da nulidade do ato, seria a Ação Declaratória de Inexistência do Ato Administrativo. Porém, diz a doutrina e jurisprudência que somente às infrações gravíssimas caberão a nulidade absoluta do ato administrativo, que poderá ser alegada por qualquer cidadão, por se tratar de norma e de interesse coletivo.
Podemos dizer ainda que a discricionariedade dá certa dose de liberdade para a Administração Pública, porém o problema surge quando a Administração confunde a liberdade com a arbitrariedade.
Deve o Estado responder pelo ato praticado pelo agente da Administração Pública que tenha causado lesão ao direito.
Para a responsabilização do Estado, a doutrina apresenta algumas teorias:
1) TEORIA DO RISCO ADMINISTRATIVO – Onde a Administração pode demonstrar culpa total ou parcial do lesado no evento danoso, assim abrindo a possibilidade da não indenização ou uma indenização menor ao possível lesado.
2) TEORIA DO RISCO INTEGRAL – A Administração Pública tem que indenizar todo e qualquer dano suportado por terceiros, independentemente da culpa do terceiro.
3) TEORIA DO RISCO INTEGRAL TEMPERADO – Temperado por caber a teoria do risco integral, porém cabe ação regressiva contra o funcionamento da Administração que agir culposa ou dolosamente conforme a CF. art. 37 § 6º.
A posição adotada pelo STF conforme RE 85.079 relator Min. Moreira Alves é o da teoria do risco integral. Porém devemos também fazer referência à prescrição, pois a obrigação de reparar o dano é de natureza civil e a ação tendente a obtê-la é pessoal. Portanto aqui devemos observar as regras de prescrição conforme o Código Civil.

ALGUMAS FORMAS DE RESPONSABILIDADE PRIVADA
1) Lei de Acidentes do Trabalho 2) Código Brasileiro de Aeronáutica 3) Código de Mineração 4) Leis regulamentadoras de seguro obrigatório de veículos 5) Leis de proteção ao Meio Ambiente 6) Código de Defesa do Consumidor.
Um dos casos típicos mais conhecidos do comum dos estudiosos do Direito é o dos atos praticados em estado de necessidade. Constituem atos lícitos, nos termos do inc. II art. 188 do Código Civil, mas podem causar danos a terceiro. Conforme esse mesmo artigo,
Art 188 não constituem atos ilícitos:
I – Os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um direito reconhecido.
II – A deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão à pessoa, a fim de remover perigo eminente.
Parágrafo único: No caso do inciso II, o ato será legítimo somente quando as circunstâncias o tornarem absolutamente necessário, não excedendo os limites do indispensável para a remoção do perigo.Quando assim suceder, apesar da sua licitude, o ato praticado obriga o agente a indenizar o lesado, salvo se este for culpado da situação de perigo, segundo a doutrina também expressa dos arts. 929 e 930 do mesmo diploma:Art. 929 Se a pessoa lesada, ou o dono da coisa, no caso do inciso II do art. 188, não forem culpados do perigo, assistir-lhes-á direito à indenização do prejuízo que sofreram.
Art. 930 No caso do inciso II do art. 188, se o perigo ocorrer por culpa de terceiro, contra este terá o autor do dano ação regressiva para haver a importância que tiver ressarcido ou lesado.
Parágrafo único: A mesma ação competirá contra aquele em defesa de quem se causou o dano(art.188, inc.I).
A Responsabilidade Civil por Ato Lícito, quando voltada para o particular, tem intima ligação com a obrigação Propter Rem.
OBRIGAÇÃO PROPTER REN: Em síntese essa é uma espécie de obrigação que desvincula o sujeito ativo da obrigação face ao bem.

Temos como exemplo:

1) Passagem forçada – art. 1285 C.C. 2) Indenização especial pela mesma servidão – 1285 C.C. 3) Indenização pelo escoamento das águas para o prédio inferior – 1289 C.C. 4) Indenização pela servidão eventual de trânsito – 1293 C.C. 5) Alargamento necessário de servidão – 1385 § 3° C.C.

A lei os declara permitidos, sendo então lícitos e passíveis de ressarcimento.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Tal trabalho tem como fulcro demonstrar aspectos da responsabilidade civil, porém em uma vertente diferenciada, procurando mostrar que o ato lícito pode ser indene e acabar com esse estigma, ou conhecimento comum que indenização por ato licito só compete ao Estado.
REFERÊNCIA
AMARANTE, Aparecida. Excludentes de Ilicitude Civil – Belo Horizonte: Del Rey, 1999.
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo – 15 – ed. São Paulo: Malheiros, 2003.
GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo – São Paulo: Saraiva, 1989.
LIBERAl, Márcia Mello Costa de (org.). Um Olhar Sobre Ética e Cidadania – São Paulo: Editora Mackenzie, 2002.
MOTTA, Carlos Pinto Coelho.Curso Pratico de direito Administrativo – Belo Horizonte: Del Rey, 2004.
NETO, Inácio de Carvalho. Responsabilidade Do Estado Por Atos De Seus Agentes – São Paulo : Atlas, 2000.
ROCHA, Carmen Lúcia Antunes. O princípio Constitucional da Igualdade – Belo Horizonte : Lê, 1990.
RT. 726/11 – São Paulo: Abril, 1996.
SCAFF, Fernando Facury. Responsabilidade Civil do Estado Intervencionista – 2 – ed. Ver. E ampl. –Rio de Janeiro: Renovar, 2001.
STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil – 6ª ed – revista, atualizada e ampliada – São Paulo : Editora Revista Dos Tribunais, 2004.



[1] Advogado, professor do ILES-ULBRA – Instituto Luterano de Ensino Superior - Universidade Luterana do Brasil, onde ministra as disciplinas de IEDII-Hermenêutica Jurídica, Direito Civil II – Direito das Obrigações e DPCII- Direito Processual Civil. Graduado em Direito pela Unitri- Universidade do Triângulo - MG, especialista em Direito Processual Civil pela FMU- Faculdades Metropolitanas Unidas - SP, mestrando pela MACKENZIE – Universidade Presbiteriana Mackenzie – SP. pierresantoscastro@yahoo.com
[2] LIBERAl, Márcia Mello Costa de (org.). Um Olhar Sobre Ética e Cidadania – São Paulo: Editora Mackenzie, 2002.

[3] Obrigación de compensar daños causados por condutas ilícitas. RT 726/11, S. Paulo, abril/96
[4] GASPARINI, Diógenes. Op cit.,p.66.

[5] BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Op. Cit., p.354.
[6] MEIRELLES, Hely Lopes. Op. Cit.,p.150.

[7] BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Op. Cit.,p, 372.

[8] SCAFF, Fernando Facury. Op. Cit., p,149.
[9] MOTTA, Carlos Pinto Coelho.Curso Pratico de direito Administrativo – Belo Horizonte: Del Rey, 2004.
[10] MOTTA, Carlos P. Coelho. Op. Cit., p218.
[11] CF/1988 art. 37§ 6º.
[12] GASPARINI, Diógenes. Op. Cit., p. 79.
[13] ROCHA, Carmen L. Antunes. Op. Cit. P.84.
[14] MOTTA, Carlos P. Coelho. Op. Cit. P. 67.

[15] MOTTA, Carlos P. Coelho. Op. Cit. P. 67.
[16] MOTTA, Carlos P. Coelho. Op. Cit. P. 73.
[17] BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Op. Cit., p.354.
[18] MOTTA, Carlos P. Coelho. Op. Cit. P. 81.

sábado, junho 16, 2007

O papel do Estado na estrutura econômica

O papel do Estado na estrutura econômica

Por Claudia Ajaj

O texto constitucional de 1988 autorizou o Estado a intervir no domínio econômico como agente normativo e regulador, com a finalidade de exercer as funções de fiscalização, incentivo e planejamento indicativo ao setor privado sempre com fiel observância aos princípios constitucionais da ordem econômica. Dentro da possibilidade de regulação da ordem econômica o texto constitucional estabeleceu em seu art. 149, a competência exclusiva da União para instituir contribuições de intervenção no domínio econômico, cuja naturaza jurídica é tributária[1].
Necessário se faz, para se entender a forma de atuação do Estado, considerar sua atuação em relação ao processo econômico, a noção da atividade econômica considerando-se serviços públicos, ou seja, área de atuação estatal, a atividade econômica área de atuação do setor privado e noção de Direito Econômico.
Questão que merece referência é a expressão intervenção e atuação do Estado, noção de intervenção, nas palavras de Eros Roberto Grau[2], em sentido rigoroso, caracteriza atuação de área de outrem, porém, se usadas as expressões para manifestar o mesmo significado, pouco importará o termo a ser usado, seja o Estado atuando no setor público, seja no setor privado. Intervenção em sentido rigoroso significa, atuação estatal em área de titularidade do setor privado, já atuação estatal, para atuação do Estado tanto na área de titularidade própria quanto de titularidade do setor privado. Assim, dá-se intervenção como a atuação estatal no campo da atividade econômica em sentido estrito e atuação estatal no campo da ação do Estado no campo da atividade econômica em sentido amplo.
Atuação do Estado em sentido estrito, acarreta transformações no direito como por exemplo o regime de contrato. Nas economias capitalistas são protegidos valores como o da propriedade dos bens de produção e da liberdade de contratar, assim, a atuação do Estado sobre o domínio econômico tem impacto sobre o regime jurídico dos contratos.
A ação estatal sobre os contratos tem extrema importância de forma que configura instituto fundamental da economia de mercado, sendo a conformação das relações contratuais conformação do exercício da atividade econômica.
A liberdade contratual, que se decompõe em liberdade de contratar ou abster-se de contratar e em liberdade de configuração interna dos contratos. Pode-se pensar o contrato como resultado de livres consentimentos e estipulação de coisa e preço.
Um dos elementos primordiais à configuração interna do contrato é o preço. Em regime de controle de preços esse elemento é determinado em grande número de casos independente da vontade das partes. Por outro lado, também as condições de validez do contrato e o condicionamento de sua execução depende de ou residem em disposições normativas ou atos administrativos externos à vontade das partes.
Com relação à padronização dos contratos, a experiência demonstrou que sua padronização por uma das partes levava a um inevitável comprometimento da liberdade de contratar daqueles que se colocam em posição adversa na relação contratual à do contratante que detém o poder de padronização. Dessa forma dá-se o surgimentode contratos com cláusulas padronizadas por ato estatal no que a relativização do princípio da liberdade de contratar enquanto liberdade de configuração interna dos contratos, por exemplo os contratos de loteamento, de seguro, as convenções comdominiais, inúmeras fórmulas contratuais praticadas no mercado financeiro.
A ordenação da atividade econômica em âmbito contratual, supõe a definição de normas que alcançam em dois níveis os agentes econômicos: comportamentos a serem assumidos perante a Administração e comportamentos a serem assumidos perante os demais agentes econômicos, assim não apenas as normas que conformam, condicionam e direcionam o exercício da atividade econômica pelos seus agentes, relação do agente econômico com o Estado, mas também as que criam direitos e obrigações atribuíveis aos agentes privados nas relações contratuais, relações dos agentes econômicos entre si.
O princípio da liberdade de conclusão ou de não conclusão de contratos, torna-se sujeito a limitações segundo Larenz[3] classificadas como: limitações imanentes ao próprio instituto contratual e limitações derivadas de princípio de economia dirigida.
Nas limitações imanentes ao próprio instituto contratual encontram-se as obrigações de contratar dos concessionários de serviços públicos e a obrigação de fazô-lo quando a recusa contraria os bons costumes.A obrigação de contratar imposta aos concessionários de serviço público, corolário do princípio inscrito no inciso IV do artigo 175 da Constituiçáo de 1988 decorre da circunstãncia de estarem sujeitos ao dever de fornecer serviço à comunidade.
Quanto às limitações derivadas de princípio de economia dirigida ainda em Larenz, surge no clima da ordenação dos mercados e se distinguem daquelas imanentes ao princípio da liberdade contratual, consubstanciando uma parcial derrogação dele. Essa classificação apresenta ainda a virtude de distinguir hipóteses em que a obrigação de contratar independe de definição legal, limitações imanentes e em que o dever de fazê-lo decorre de expressa previsão do Poder Legislativo, limitações não imanentes.
A atuação estatal ordenadora do processo econômico se manifesta de modo incisivo que não se limita o Estado a simplesmente impor a celebração coativa de contratos mas define como compulsório o próprio exercício da atividade econômica.
A técnica dos contratos coativos não importa jamais a substituição da vontade das partes pela vontade imposta pela lei, o que neles há é tão somente a substituição da vontade de uma das partes pela vontade da lei e não se pode descrever os contratos coativos nestas condições, como inteiramente supressivos das vontades próprias dos contratantes. Neles apenas uma das partes é vinculada cabando a outra optar por contratar ou não contratar. As partes, mesmo no contrato coativo estão entre si relacionadas por vínculo obrigacional, o contrato coativo é ainda contrato, só que nele o particular é alcançado pelo dever de contratar isto é, de assumir obrigação perante terceiro.

Conceitos de serviço público e atividade econômica

Ainda sobre a distinção de intervenção (atuação estatal no campo da atividade econômica em sentido estrito) e atuação estatal (ação do Estado no campo da atividade econômica em sentido amplo), pode-se dizer que a Constituição de 1988 aparta ambos, conferindo tratamento peculiar, atividade econômica e serviço público. No artigo 173 enuncia as hipóteses em que é permitida a exploração direta da atividade econômica pelo Estado além de , no § 1° deste mesmo artigo 173 indicar regime jurídico a que se sujeitam empresa pública, sociedade de economia mista e suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços. No artigo 175 define incumbir ao Poder Público a prestação de serviços públicos além disso o artigo 174 dispõe sobre a atuação do Estado como agente normativo e regulador da atividade econômica. A necessidade de distinguirmos atividade econômica e serviço público é no quadro da Constituição de 1988 inquestionável.
Inexiste oposição entre atividade econômica e serviço público, pelo contrário, na segunda expressão está subsumida a primeira.
Serviço público é o tipo de atividade econômica cujo desenvolvimento compete preferencialmente ao setor público, pode-se notar que o setor privado presta serviço público em regime de concessão ou permissão. Assim pode-se afirmar que o serviço público está para o setor público assim como a atividade econômica está para o setor privado.
A determinação dos sentidos que assume a expressão atividade econômica nos artigos 170, 173 e seu § 1° e 174 da Constituição de 1988 pode ser operada. Dessa forma, no art. 173 em seu § 1° a expressão conota atividade econômica em sentido estrito. Indica o texto constitucional no art. 173 caput as hipóteses nas quais é permitida ao Estado a exploração direta da atividade econômica. Trata-se aqui de atuação do Estado, isto é, da União, do Estado-membro e do Município como agente econômico em área de titularidade do setor privado. Assim, a atividade econômica em sentido amplo é território dividido em dois campos: o do serviço público e o da atividade econômica em sentido estrito. As hipóteses indicadas no art. 173 CF são aquelas nas quais é permitida atuação da União, dos Estados-membros e dos Município neste segundo campo.
Na redação do 173 em seu § 1° alterada pela emenda constitucional n. 19/98, a expressão conotava atividade econômica em sentido estrito, determinava ficassem sujeitas ao regime próprio das empresas privadas inclusive quanto às obrigações trabalhistas e tributárias a empresa pública, a sociedade de economia mista e outras entidades que atuassem no campo da atividade econômica em sentido estrito, o preceito á toda evidência não alcançava empresa pública, sociedade de economia mista e entidades (estatais) que prestassem serviço público.
No concernente ao artigo 173, caput, a expressão atividade econômica conota o gênero e não a espécie, o que afirma o preceito é que toda atividade econômica inclusive a desenvolvida pelo Estado no campo dos serviços públicos deve ser fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tendo por fim, assegurar a todos existência digna conforme os ditames da justiça social. Nessa circunstância, não resta dúvida de a expressão assumir a conotação de atividade econômica em sentido amplo.

Princípios gerais da atividade econômica

A ordem econômica constitucional nos artigos 170 a 181 CF, com fundamento na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, assegura a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independente de autorização de órgãos públicos exceto nos casos previstos expressamente em lei . Como salienta Raul Machado Horta

“no enunciado constitucional, há princípios – valores: soberania nacional, propriedade privada, livre concorrência, há princípios que se confundem com intenções: reduções das desigualdades regionais, busca do pleno emprego; tratamento favorecido para as empresas brasileiras de capital nacional de pequeno porte (alterada pela EC n. 6/95); função social da propriedade. Há princípios de ação política: defesa do consumidor, defesa do meio ambiente.”[4]


São princípios gerais da atividade econômica:

- Soberania naciona: repetição do princípio geral da soberania (CF, arts. 1°, I e 4°), com ênfase na área econômica;
- Propriedade privada: corolário dos direitos individuais previstos no art. 5°, XXIII, XXIV, XXV, XXVI, da Carta Magna;
- Função social da propriedade: corolário da previsão do art. 5°, XXIII, e art. 186, CF.
- Livre concorrência: constitui livre manifestação da liberdade de iniciativa, devendo, inclusive, a lei reprimir o abuso do poder econômico, que visar a dominação dos mercados, eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário de lucros (CF, art. 173, § 4°);
- Defesa do consumidor;
- Defesa do meio ambiente: a Constituição Federal trata de forma ampla e defesa do meio ambiente no Título VIII – Da ordem social; capítulo VI (art. 225). Observe-se que, para esse fim, a EC n. 42/03 ampliou a defesa do meio ambiente, prevendo como princípio da ordem econômica a possibilidade de tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação;
- Redução das desigualdades regionais e sociais: constitui também um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil (CF, art. 3°, III);
- Busca do pleno emprego;
- Tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras que tenham sua sede e administração no País: a EC 06/95, alterou a redação dos artigos 170, IX, 176, §1°, revogou o artigo 171, e criou o artigo 246na CF, trazendo novidade em relação ao tratamento das empresas brasileiras. A redação anterior previa como um dos princípios da ordem econômica, o “tratamento favorecido para as empresas brasileiras de capital nacional de pequeno porte” . Por sua vez, o art. 171, que trazia as definições dea empresa brasileira e empresa brasileira de capital nacional, foi revogado inexistindo qualquer diferenciação ou benefício nesse sentido inclusive em relação à pesquisa e à lavra de recursos minerais e aproveitamento dos potenciaiss de energia hidráulica; em face da alteração da redação originária do art. 176, § 1°, CF, basta que sejam empresas constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País.
[1] MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional.19° ed., São Paulo: Atlas, 2006, p.725.
[2] GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988 (Interpretação e Crítica). 10° ed., São Paulo: Malheiros, 2005. p. 93.
[3] GRAU, Eros Roberto, A Ordem Econômica... Op. Cit. P. 98 apud Derecho de Obligaciones, trad. De Jaime Santos Briz, Ed. Revista de Derecho Privado, Madri, 1958, t. I, pp. 66 e ss.
[4] MORAES, Alexandre de. Op. cit. p. 723 apud HORTA, Raul Machado. Estudos de direito constitucional. Belo Horizonte: Del Rey, 1995, p. 296

CIDADÃO, OBJETO FISCAL

CIDADÃO, OBJETO FISCAL
Ives Gandra da Silva Martins
Professor Emérito da Universidade Presbiteriana Mackenzie
(Gazeta Mercantil – 16/05/2007)

Diogo Leite de Campos, professor catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, em seu estudo “A jurisdicização dos impostos: garantias de terceira geração”, inserido no livro “O tributo – Reflexão multidisciplinar sobre sua natureza” (coordenação minha, Editora Forense, edição de 2007), escreve: “A degradação da pessoa dos cidadãos vai mais longe: estes são vistos como meros objetos da atividade administrativa”. E continua: “O contribuinte deve estar invisível, enquanto a Administração lhe mede os bens e os rendimentos ....” até ao mais pequeno torrão”, parafraseando Lactâncio: “deve mover-se se esta lho exigir; pagar quanto a tal for obrigado. É objeto, não sujeito”.
O estudo jurídico do eminente catedrático coimbrão de renome internacional conclui que só há justiça quando o direito se faz entre iguais, isto é, quando “o Estado é participado, definido e controlado diretamente pelos cidadãos”.
À evidência, nada há de mais distante da justiça tributária do que a política de arrecadação e coação adotada pela República Brasileira, “democrática” mais no nome, do que na realidade dos atos praticados pelos detentores do poder.
De início, impõem, sem consultar o povo, a mais alta carga tributária dos países emergentes, e das mais altas do mundo civilizado, ofertando em troca apenas um plano assistencialista, que muitas vezes incentiva o ócio (bolsa-família) e migalhas de serviços públicos, normalmente de péssima qualidade, como se verifica em boa parte dos setores da saúde e educação.
Em compensação, os tributos pagos pelo “cidadão-objeto” abarrotam os bolsos dos detentores do poder, seja em subsídios diretos, seja nas fantásticas benesses dos benefícios indiretos, que levam parlamentares e membros de outros poderes a gozar de ajudas de custo, verbas de gabinete, carros, empregados, tudo pago pelo Tesouro, sem necessidade de recolher sobre estas verbas imposto de renda, como qualquer “cidadão-objeto” do segmento não-governamental.
Por outro lado, tudo se justifica pela necessidade de apoio dos partidos “políticos”, meros conglomerados de interesses, que mudam de nome, tanto quanto seus senadores, deputados e vereadores eleitos mudam de legendas, como, no século XVIII, os condutores das diligências mudavam de cavalos, em cada entreposto. Quando o governo multiplica Ministérios, Secretarias, cargos de confiança - como as células cancerosas multiplicam-se, nos organismos humanos não tratados-, por mais que se arrecade, a receita é sempre insuficiente para o tamanho de uma máquina esclerosada que não pára de crescer.
Ministérios, Secretarias são disputados não em função da especialidade dos que deveriam servir ao povo, mas em função das verbas que o Presidente lhes destina, para que o seu detentor -aliado de ocasião e conveniência- possa manipulá-las. Estas verbas são resultantes dos tributos pagos pelo “cidadão-objeto”, que nada controla diretamente e vê grande parte delas ser veiculada por medidas provisórias.
Nem mesmo o artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal é respeitado. Leia-se: “LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes” (grifos meus).
Para que, entretanto, o “cidadão-objeto” não se defenda, apesar de a ampla defesa administrativa e judicial ser garantida pela “Constituição Cidadã” de Ulisses Guimarães, concebem-se, sem qualquer pudor, os mais arbitrários projetos. E o “cidadão-objeto” vê seus direitos decrescerem, numa degradação –na feliz expressão de Diogo Leite de Campos- como nem nos tempos do regime militar se viu. Projetos como execução fiscal sem participação do Judiciário; de redução de direitos de defesa, nos Conselhos de Contribuintes, perante o qual o advogado do “cidadão-objeto” não pode participar das sessões secretas, mas o advogado dos detentores do poder tem presença garantida; vinculação das decisões dos conselheiros ao teor das Instruções Normativas emanadas da administração superior, que proíbe a apreciação de matéria constitucional; desobediência dos agentes da Secretaria da Receita Federal, que autuam profissionais liberais e outros trabalhadores, que se organizam em sociedades fundamentados na garantia constitucional de livre associação, reiterada no art. 129 da Lei 11.196/05 (que converteu a Medida Provisória do Bem), além de muitas outras ações deste jaez - demonstram que, na República Fiscal Brasileira, caminhando para a plena ditadura do Fisco, o cidadão é mesmo, e cada dia mais, um mero objeto, um “patrimônio personificado”, que deve ser confiscado em prol de se manter o alto nível de subsídios e mordomias dos detentores do poder.
Não sem razão, o Brasil cresce pouco. Continua, apesar de toda a sua potencialidade, recebendo poucos investimentos estrangeiros, se comparados com outros emergentes de nosso nível, e corre o risco, ao menor sintoma de reversão do “boom econômico” mundial, de mergulhar numa crise sem precedentes, em que as empresas desaparecerão sufocadas pelo peso da Administração esclerosada, cujos feitores estão ai para pisotear o “cidadão-objeto”.
Pergunto-me: com os novos anteprojetos redutores dos direitos do contribuinte e que instituem arrecadação arbitrária para aumento do nível impositivo, para onde vamos? Transformar-nos-emos em “escravos-objeto”?

Direito da Concorrência

DIREITO DA CONCORRÊNCIA: INSTRUMENTO DE IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS PARA O DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

Rafael Rocha de Macedo[1]

Nos últimos anos o direito da concorrência, ou direito antitruste, tem ocupado lugar de destaque no contexto das políticas públicas. Vários fatores podem ser atribuídos a esse fenômeno decorrente do “triunfo do capitalismo”, dentre os quais destacam-se a globalização e a disseminação em escala mundial da ideologia do livre mercado.
Esse ramo do direito, intimamente relacionado aos conceitos de regulação e limitação poder econômico, origina-se de uma premissa sócio-econômica fundamental, segundo a qual todo agrupamento social, organizado sob a tutela de um poder estatal, que tenha como fundamento a economia de mercado, deve possuir um conjunto de princípios e regras capazes de possibilitar seu funcionamento e garantir um nível mínimo de controle nas relações econômicas[2]. Parte-se do princípio de que o mercado, a despeito de ser uma instituição socioeconômica[3] tipicamente capitalista, apresenta falhas em certas circunstâncias, sendo, portanto, incapaz de se auto-regular em termos absolutos.
O direito da concorrência busca instituir normas a garantir o funcionamento do mercado, proporcionando a alocação eficiente dos recursos e a maximização do bem-estar dos mercados consumidores, repelindo condutas anticoncorrenciais, a exemplo do abuso do poder econômico sob suas variadas formas[4]. Essa política foi incorporada à Constituição Brasileira sob uma ótica desenvolvimentista, que busca sistematizar os dispositivos relativos à configuração jurídica da economia e à atuação do Estado no domínio econômico, voltada para a transformação das estruturas sociais, mediante a instituição de “uma ordem econômica aberta para a construção de uma sociedade de bem-estar”, pautada por uma série de princípios fundamentais.
Este trabalho ocupa-se de analisar e sugerir algumas linhas de investigação e reflexão acerca da defesa da concorrência, assim considerada como ingrediente fundamental do desenvolvimento econômico. Parte-se do princípio que a competição, aliada à eficiência e ao progresso tecnológico inerente, tem impactos diretos na produtividade, implicando em crescimento sustentado.
O tema é oportuno e relevante. Sua análise é feita em momento de reestruturação das leis de concorrência no Brasil, onde o tema “política de desenvolvimento econômico” tem ocupado o centro dos debates nacionais. O contexto internacional é também de relevância. Hoje vários estudiosos da economia defendem uma abordagem do desenvolvimento em concomitância com objetivos socioeconômicos que transcendem a perspectiva de mero funcionamento dos mercados[5], que ao contrário do que afirmam os postulados clássicos, não são perfeitos em regra.
O locus de análise do direito antitruste é o mercado[6], que do ponto de vista da teoria do direito, pode ser visto como um conjunto de instituições socioeconômicas que permite interações constantes entre consumidores e fornecedores, a externar demandas de produtos e serviços. Referido conjunto conforma uma série de questões ou pontos de equilíbrio, que se inter-relacionam e oscilam conforme seu perfil e desempenho.
É bem verdade que o mercado constitui estrutura inerente ao capitalismo, assim sua manutenção é necessária para o funcionamento do sistema que tem por vocação a busca do lucro. Assim, se a manutenção do mercado é objeto tutelado pelo direito da concorrência, que por sua natureza, constitui instrumento de intervenção na economia, está-se diante de um paradoxo aparente: intervenção estatal no mercado para a manutenção da ordem liberal vigente.
A concepção liberal de mercado, como resultante de uma ordem natural espontânea, passível de auto-regulação, sem necessidade de intervenção normativa despreza uma gama de pontos de sensibilidade, também decorrentes do impacto deste na sociedade, a exemplo do meio ambiente, da necessidade da ampliação dos mercados consumidores, do monetarismo, da opinião pública, do desenvolvimento econômico entre outros.
Esta situação demonstra um pretenso “estágio de superação do liberalismo” resultante de pelo menos dois fatores: a constatação de falhas no mercado e a verificação de que a sociedade tem objetivos, não estando propensa a tolerar momentos de escassez proporcionados pelas “falhas do mercado”, como se pode verificar ao longo da história.
As referidas “falhas do mercado” têm sido objeto de estudo de vários pensadores econômicos, dentre os quais destaca-se John Maynard Keynes, que em sua obra “A teoria geral do emprego, dos juros e da moeda”, apontou necessidades de mudanças a fim de preservar o sistema capitalista.
A incapacidade do mercado de resolver suas falhas, implicou na necessidade de elaboração de políticas econômicas de concorrência passíveis de afetar a própria acumulação capitalista. Daniel Goldberg[7] denomina política pública de concorrência, a conjunção de: (i) a prática das autoridades da concorrência e tribunais que, interpretando e aplicando o conjunto de normas vigentes para perseguir determinado objetivo, confere um caráter dinâmico às regras antitruste, (ii) a edição de normas em abstrato que tenham impacto sobre mercados livres ou regulados e (iii) critérios governamentais que pautam a alocação de recursos a uma ou outra prioridade sobre as quais, discricionariamente, pode dispor qualquer autoridade de concorrência.
Neste contexto, o Estado deixa de ser meramente garantidor formal da concorrência mercantil, como pretendia a ordem liberal, para tornar-se implementador de políticas públicas econômicas orientadas à perpetuação das condições de acumulação capitalista.
Em princípio a idéia de regulação pelo Estado, face ao ânimo de acumulação capitalista, vezes até motivado por fatores sociais, pode parecer uma evolução do ponto de vista sociológico, mas não sob o aspecto filosófico. Trata-se meramente de um instrumento de manutenção do capitalismo[8] ou do status quo.
Há uma convergência entre propostas liberais e planificadoras, que, fugindo aos riscos de opção radical pelo livre mercado, procura encontrar a medida certa entre Estado e mercado, assim sendo, o direito da concorrência constitui em uma forma de fazer com que a desregulamentação e a liberalização prevaleçam em um mesmo ambiente econômico.
Neste contexto, a criação de leis legislação antitruste, não é uma questão meramente política, mas uma necessidade sistêmica da econômica liberal[9], que ocorreu em simultaneidade com a globalização econômica e a abertura dos mercados.
Até início dos anos 90, considerável parcela das economias, em especial as dos chamados “países em desenvolvimento” eram fechadas, caracterizadas por um alto grau de intervencionismo e monopólio estatal. A partir de então, por demandas decorrentes da globalização, da política internacional e do capitalismo orientado sob a ótica liberal, iniciou-se um processo de abertura econômica e privatização de empresas estatais.
Na época muitas empresas recém-privatizadas, especialmente as prestadoras de serviços de caráter público, permaneceram monopolistas ou detentoras de excessivo poder de mercado, situação que veio a demandar regulação tanto pelo mercado, quanto por meio de políticas de Estado.
Os grandes conglomerados mundiais, bem como os países desenvolvidos têm defendido a instituição de políticas antitruste em âmbito mundial à medida que estas possibilitam o acesso aos mercados por meio de regras claras de funcionamento[10]. Neste enfoque, os países em desenvolvimento devem instituir referidas normas para beneficiarem-se do processo de globalização[11].
As leis de concorrência têm se demonstrado instrumentos componentes de uma política de desenvolvimento econômico[12]. Ivo Waisberg[13] afirma que a estrutura das leis antitruste para os países em desenvolvimento deve levar em consideração, como um de seus objetivos, o interesse pelo desenvolvimento, e recorda que a referida perspectiva não é a adotada pelos países desenvolvidos, a exemplo dos Estados Unidos. Waisberg, cita Fox[14], autor norte americano que aponta a existência tensões entre modelos de antitruste e desenvolvimento:
Historicamente, leis e política antitruste têm estado entre dois paradigmas: defesa da concorrência e pró-eficiência. A aceitação do primeiro minimizou as diferenças entre política de concorrência e interesses de desenvolvimento, tornando possível imaginar a harmonização das regras restritivas de comércio daquelas nações que desejavam promover a competição e aquelas que desejavam limitar a exploração. Por outro lado, o segundo paradigma aguçou as diferenças entro os objetivos de eficiência dos países capitalistas industrializados e os interesses de desenvolvimento dos países em desenvolvimento, tornando a harmonização algo irreal.
(FOX, 1989 apud WAISBERG et al., 2005, p. 25).

Nesta análise, é necessário observar que existem disparidades entre as estruturas institucionais dos países já desenvolvidos e aqueles que não completaram o processo, que, em decorrência de problemas sociais e econômicos, podem conflitar com o objetivo de eficiência da teoria neoclássica da Escola de Chicago. De fato nos países de industrialização tardia, os problemas concorrenciais vão além da eficiência econômica, sendo difícil jogar pelas regras da doutrina do livre mercado. Onde não há educação, saúde pública e dignidade humana, a competição torna-se um fator secundário.[15]
Uma política de concorrência adequada a países em desenvolvimento inclui a adoção de medidas de estímulo da competição, proteção de consumidores e criação de mecanismos de controle de concentração, sem que estes inviabilizem a constituição ou atuação de players com alto poder de mercado dependendo do caso. Entretanto, tais medidas devem ser inseridas em um contexto mais amplo a buscar um equilíbrio definido entre as leis antitruste, de modo a orientar um desenvolvimento econômico fixado a título de políticas públicas, que nas palavras de Maria Paula Dallari Bucci (2002) devem ser vistas como processo ou conjunto de processos que culminam na escolha racional e coletiva de prioridades, para a definição de interesses públicos reconhecidos pelo direito.
Na busca do referido equilíbrio não se descarta a previsão de que as leis antitruste possuam mecanismos passíveis de flexibilização ou isenção casuística para fins de orientação da política concorrencial para o desenvolvimento econômico, claro que mediante decisões fundamentadas e prazo fixado, na perspectiva de motivos preponderantes para a economia nacional ou para o bem comum.
É evidente que algumas premissas devem ser consideradas no processo de formulação de políticas públicas no direito da concorrência. A principal delas é a ciência de que a economia opera-se em escala global, mas exige enfoque local na implementação das decisões.
Questões como o tamanho do mercado informal, o tamanho da economia, potencial para eficiências, barreiras à entrada, custos de transação, ausência de uma cultura de concorrência e problemas de economia política[16] devem ser consideradas, medidas e pormenorizadas para a adoção de uma política de concorrência equilibrada e eficiente com vistas a buscar o desenvolvimento. Tal análise é necessária porque existem distintos parâmetros de desenvolvimento e de potenciais econômicos que variam de Estado para Estado.

Referências Bibliográficas
ANDRADE, Rogério Emílio, A intervenção dos poderes públicos na formação dos preços no mercado, 2002. Dissertação (Mestrado em Direito Político e Econômico) – Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2002.
BAGNOLI, Vicente. O direito da concorrência e sua aplicação na área de livre comércio das Américas. 2003. 275 f. Dissertação (Mestrado em Direito Político e Econômico) – Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2003.
BELLUZZO, Luiz Gonzaga. Globalização e Estado Nacional, 2007. Disponível em http://www.mhd.org/artigos/belluzzo_globaliza.html. Acesso em: 10 de maio de 2007.
BERCOVICI, Gilberto. Constituição Econômica e desenvolvimento: uma leitura a partir da Constituição de 1998. São Paulo: Malheiros, 2005.
BORK, R. The Antitrust Paradox. New York: Basic Books. 1978.
Citar Bercovici e Eros Grau
FONSECA, João Bosco Leopoldino da, Direito Econômico. Rio de Janeiro: Forense, 2003
FOX, Eleanor. Harnessing the Multinational Corporation to Enhanc eThird World Development -- The Rise and Fall and Future of Antitrust as Regulator, Cardozo: L. Rev, 1989.
GOLDBERG, Daniel Krepel. Poder de compra e política antitruste. 2005. Tese (Doutorado em Direito) – USP, São Paulo, 2005.
GRAU, Eros Roberto, A ordem Econômica na Constituição de 1988. São Paulo: Malheiros,2001.
HUBNER, M. M.(1998). Guia para Elaboração de Monografias e Projetos de Dissertação de Mestrado e Doutorado. São Paulo: Pioneira: Mackenzie.
IRTI, Natalino. L’ ordine giuridico del mercato. 3.ed. Roma: Laterza, 1998.
MASCARO, Allyson Leandro. Crítica da legalidade e do direito brasileiro. São Paulo: Quartier Latin, 2003.
OLIVEIRA, Gesner. Por uma política moderna de defesa da concorrência no Brasil: comentários. Disponível em Acesso em 15 de maio de 2007.
PASUKANIS, Eugeny Bronislanovich. A teoria geral do direito e o marxismo. Rio de Janeiro: Renovar, 1989.
SALOMÃO FILHO, Calixto. Direito da Concorrência: as estruturas. São Paulo: Malheiros, 2002.
SZTAJN, Rachel. Teoria jurídica da empresa: atividade empresária e mercados. São Paulo: Atlas, 2003.
WAISBERG, Ivo. Direito e política da concorrência para os países em desenvolvimento. 2005. Tese (Doutorado em Direito) – PUC-SP, São Paulo, 2005.
[1] Mestrando em Direito Político na Universidade Presbiteriana Mackenzie, advogado em Goiás e São Paulo.
[2] SALOMÃO FILHO, Direito Concorrencial: as estruturas. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p.20.
[3] A expressão é de autoria de Rachel Sztajn: “Possível pensar-se em mercados como instituições socioeconômicas; Instituição, do étimo latino instituere, que se traduz por fundar, ordenar, regular, é palavra que denota a intenção de quem a sua de chamar a atenção para uma das funções, talvez a mais relevante, dos mercados: a de ordenar ou regular a troca econômica, tornar eficiente a circulação de bens na economia”. SZTAJN, Rachel. Teoria jurídica da empresa: atividade empresária e mercados. São Paulo: Atlas, 2003. p.33.
[4] Calixto Salomão Filho atribui a fixação dos objetivos fundamentais como a mais importante divergência da teoria econômica em matéria antitruste, analisando em sua obra as várias concepções acerca da finalidade do direito da concorrência que oscilam fundamentalmente entre “o bem estar econômico do consumidor” e “a preservação do mercado”. Entre estas diferentes teorias gravitam outros interesses tutelados que variam de acordo com políticas econômicas, sistemas jurídicos e aspectos históricos. Op. cit. p.22.
[5] Tal afirmação permite uma série de reflexões em vários níveis acerca das relações que se estabelecem entre os conceitos de justiça e eficiência, temas que por vezes foram apresentados ora como sinônimos, ora como dicotomias. A interpretação de que “justo é ser eficiente” ou de que “ou é eficiente ou é justo” também geram uma série questionamentos e reflexões de ordem jurídico-filosófica.
[6] Cf. IRTI, Natalino. L’ ordine giuridico del mercato. 3ª ed. Roma: Laterza, 1998.
[7] GOLDBERG, Daniel Krepel. Poder de compra e política antitruste. 2005. Tese (Doutorado em Direito) – USP, São Paulo, 2005.
[8] Neste sentido é interessante a análise do filósofo marxista Eugeny Pasukanis que em sua obra Teoria Geral do Direito e o Marxismo, situa a legalidade na circulação mercantil, vinculando direito e capitalismo: “O próprio Marx salienta que as relações de propriedade, que constituem a camada fundamental e mais profunda da superestrutura jurídica, se encontram em contato tão estreito com a base, que aparecem como sendo as mesmas relações de produção , das quais são a expressão jurídica. O Estado, ou seja, a organização da dominação política de classe, nasce sobre o terreno de relações de produção e de propriedade determinadas. As relações de produção e sua expressão jurídica formam o que Marx denominou, na esteira de Hegel, de a sociedade civil. A superestrutura política e notadamente a vida política estatal oficial são momentos secundários e derivados”. (PASUKANIS, 1989, p.61 )

[9] A criação de leis de concorrência tem sido recomendada pelos países desenvolvidos a países em vias de desenvolvimento, como importante mecanismo para garantir e melhorar as reformas feitas anteriormente (combate à inflação, estabilidade monetária, abertura dos mercados, entre outros), ao mesmo tempo em que a desregulamentação e a liberação do comércio espalharam-se pelo mundo, em especial na década de 90.
[10] Em seminário realizado em 09.06.2006 durante o 1º Seminário de Concorrência da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Gesner de Oliveira afirmou que defesa da concorrência e regulação, constituem fatores cruciais para o desenvolvimento. Segundo ele, a regulação em particular demanda regras claras e estáveis passíveis de atração de investimentos que poderão em tese propiciar um crescimento sustentado.
[11] A adoção de políticas de concorrência tem sido exigência de organismos como o FMI e Banco Mundial para concessão de empréstimos e financiamentos.
[12] A idéia de conjugação entre política de concorrência e desenvolvimento econômico, conforme afirmou Gesner de Oliveira no 1º Seminário de Concorrência da Universidade Presbiteriana Mackenzie, é passível de gerar duas visões equivocadas: 1) a de que os países em desenvolvimento deveriam replicar “as melhores práticas” dos países desenvolvidos e 2) a de que a defesa da concorrência não é importante para os países desenvolvidos. De qualquer forma, várias evidências sugerem de que a defesa da concorrência aplicada como uma política pública para o desenvolvimento é ainda mais importante aos países que ainda não atingiram o nível de desenvolvimento desejado.
[13] WAISBERG, Ivo. Direito e política da concorrência para os países em desenvolvimento. 2005. Tese (Doutorado em Direito) – PUC-SP, São Paulo, 2005.
[14] FOX, Eleanor. Harnessing the Multinational Corporation to Enhanc eThird World Development -- The Rise and Fall and Future of Antitrust as Regulator, Cardozo: L. Rev, 1989.
[15] Op. cit. p.28.

[16] OLIVEIRA, Gesner. Por uma política moderna de defesa da concorrência no Brasil: comentários. Disponível em Acesso em 15 de maio de 2007.